Foi pouco depois que minha mãe faleceu. Depois de passar quase um ano cuidando dela no hospital, saindo cedinho e voltando à noite, minha vida ficou sem sentido. Ela se foi, deixando no meu peito uma dor imensa, um vazio, como se tivessem me arrancado o coração com as mãos. Eu não queria sair, não queria ver ninguém, não me cuidava, mal conseguia cuidar do necessário à sobrevivência dos meus filhos e marido, jogar roupa na máquina, estender, guardar, fazer comida, lavar a louça, mandar para a escola... O dia todo deitada, dormia, acordava, arrumava lanche, pendurava roupa, punha roupa na máquina, lavava a louça, dormia de novo... Meu marido e meus filhos já não aguentavam mais me ver daquele jeito, inventavam coisas para fazermos, mas simplesmente eu não conseguia sair daquele poço sem fundo que é a depressão, mesmo com remédios. Então os quatro saíram para comprar um presente no dia das mães, acabaram trazendo três: o vaso com sedum"rabo-de-burro", ainda bem pequeno, uma pequena planta-jade e um cactus. Empolgados, as crianças queriam que fizéssemos um mini-jardim. Não querendo parecer ingrata, levantei da cama na segunda-feira, dei café da manhã a eles e após mandá-los para a escola, troquei meu pijama, coisa que já não me importava em fazer, passei um pente pelo cabelo, passei batom e saí em busca de uma bacia de cerâmica e pedriscos para o tal mini-jardim. Voltei para casa com uma bacia, cinco vasos de cerâmica, oito mudas de suculentas variadas, um saco de 20 quilos de terra. e um pacotinho de 5 quilos de pedriscos. O taxista teve que me ajudar a descer tudo do carro. Uns meninos que moravam na minha rua ajudaram a subir com tudo. Mal pude esperar que as crianças voltassem da escola. Eles nem almoçaram direito de tanta ansiedade. Entãao pusemos mãos-às-obras. Fizemos aquela bagunça, o terraço ficou uma lama só. Logo tiveram a ideia de pintar os vasos. Corremos na papelaria e compramos tinta guache mesmo. Pintamos de cores vivas, depois decidimos fazer pintura vazada por cima. Nem percebemos o dia passar. Marido chegou e cadê janta? "Vamos comer pizza, pai" e ele concordou, em plena segunda-feira. A carinha dos meus filhos, vendo a mãe fazendo bagunça ao invés de brigar com eles foi o melhor presente. Ali relembrei algumas lições, lições ensinadas pela minha mãe, pelas minhas avós... a maior lição foi:
Não é preciso muito para ser feliz.
Daquelas pioneiras, o rabo de burro, o cactus e a planta-jade sobreviveram. As outras... Bem, as outras vão ficar para o próximo post.